quarta-feira, 21 de novembro de 2012
Documentário Relicárias
Na última segunda-feira (19), aconteceu a estréia do documentário Relicárias, produzido pela Della Porta. Acompanhamos quatro mulheres, que mostraram suas visões, opiniões e experiências diárias de suas religiões. Cada uma de sua forma contribui para que as pessoas conheçam mais de perto um pouco mais sobre as religiões escolhidas, que foram o catolicismo, umbandismo, judaísmo e espiritismo.
Agrademos a essas mulheres que nos deram a oportunidade de acompanhar a vivência de suas crenças.
Em breve iremos disponibilizar o documentário na íntegra.
Segundo Richard Peña, o cinema independente está em vias de extinção
"Hoje, é impossível caracterizar o cinema independente”, dizia Richard Peña, na sexta-feira, a um grupo de alunos da Escola Superior de Teatro e Cinema na Amadora (ESTC). “A perspectiva [do cinema independente] era clara: criar uma alternativa ao que Hollywood oferecia. Foi assim desde os anos 20 até aos anos 80. Depois, os independentes perderam isso, e a vanguarda que existia deslocou-se para as galerias e os museus. Há pessoas que fazem os seus filmes, mas, como movimento de importância cultural, o cinema independente já acabou.”
Fonte: www.publico.pt
segunda-feira, 12 de novembro de 2012
Os irmãos Schumann
Mais conhecidos como irmãos Schumann, Willy e Werner nasceram em União da Vitória, cidadezinha do sul do Paraná. Mas após três anos, em 1968, a família mudou-se para Curitiba. Atualmente, Werner mora na Inglaterra e Willy, que chegou a morar em Munique, Alemanha, voltou a morar na capital paranaense.
Werner estudou fotografia, roteirização e montagem na Fundação Cultural de Curitiba e Willy é formado em Jornalismo, diretor de cinema e produtor audiovisual. Os dois já desenvolveram vários projetos juntos, entre eles os filmes “De Bona - Caro Nome”(vencedor do Prêmio Fiat do Brasil), “Ervilha da Fantasia” (sobre o poeta Paulo Leminski), “Pioneiro do Cinema” (vencedor do Prêmio do Governo do Estado do Paraná e do Tatu de Ouro de Melhor Ficção na XXI Jornada Internacional de Cinema da Bahia), entre outros.
Abaixo vocês lerão a entrevista que fizemos com o cineasta Willy, que conta um pouco sobre sua história e sua vivência no mundo do cinema. Não deixe de conferir os links vinculados aos filmes citados!
O WILLY
- Quando percebeu que gostava de cinema?
Foi em meados da década de 80. Éramos muito jovens e descobrimos a possibilidade de fazer filmes na bitola 8 mm, através de cursos promovidos pela Cinemateca do Museu Guido Viaro, atual Cinemateca de Curitiba.
- Há alguma figura do mundo do cinema em que se espelhe?
Seria um “lugar comum” ficar citando cineastas que nos influenciaram ou os filmes que foram mais impactantes para nós, mas claro que há vários diretores europeus e americanos que, a partir de seus filmes, enriqueceram a nossa maneira de fazer filmes.
OS SCHUMANN
Werner e eu somente trabalhamos juntos quando há um projeto fílmico de interesse comum. Trabalhar com ele é ótimo porque é um homem centrado naquilo que faz. Temos uma relação de muita amizade e cumplicidade.
- Em seus primeiros trabalhos, acreditavam que chegariam tão longe?
Nós não pensávamos a respeito. O que nos fascinava era a magia de se contar uma história através da construção imagética.
A PARCERIA
- Qual o prêmio recebido que mais te surpreendeu, que achava que não iriam ganhar?
Foi no inicio da década de 90. Um dos prêmios que nos surpreendeu foi o troféu “Tatu de Ouro” de Melhor Ficção na XXI Jornada Internacional de Cinema da Bahia pelo filme “Pioneiro do Cinema”, que foi roteirizado, dirigido e interpretado por nós. Aliás, nós nunca fizemos cinema para buscar prêmios. Os festivais são necessários porque há uma grande visibilidade para mostrar um filme independente.
- Poderia fazer um comentário sobre o filme “Ervilha da Fantasia”,vencedor do Curitiba Arte10, e também sobre “O Coro”?
O filme “Ervilha da Fantasia”, que é co-produzido por mim e dirigido pelo Werner, foi feito sem pretensão alguma. Queríamos registrar o pensamento do poeta Paulo Leminski que tínhamos contato e nos fascinava pela sua obra. Com o passar do tempo, o filme se tornou importante pelo registro de um artista, pensador imortal. São os caprichos da história cultural do nosso país.
“O Coro” é um filme, cuja temática, abre uma importante discussão sobre o existencialismo, além de ter uma linguagem, que de certa maneira, foi influenciada por esse período em que vivemos na Europa. O Werner hoje ainda mora na Inglaterra, e eu, que vivi por dois anos na Alemanha, em Munique, agora estou no Brasil.
Ervilha da Fantasia
O Coro
Ervilha da Fantasia
VISÃO
- Qual a principal diferença que você identifica entre o cinema brasileiro e o cinema exterior?
O que difere o cinema brasileiro do cinema europeu ou americano é a sua linguagem e propósito cultural. Até mesmo a luz tropical é bem diferente da luz europeia e americana.
- Como você enxerga o cinema curitibano perante o resto da produção do país?
É um cinema que vem ganhando espaço. A partir do momento que se produz filmes de qualidade, se ganha o respeito da crítica e consequentemente acaba indo de encontro a uma possibilidade mercadológica. Você pode produzir um filme no lugar mais remoto do planeta, mas se ele tiver alguma consistência ele terá seu espaço.
- Em que fase acredita que o cinema brasileiro se encontra: ainda iniciando, já possui grandes projetos, ou longe de se destacar na esfera internacional?
O cinema brasileiro é um cinema de muitas fases. Enquanto indústria de entretenimento ainda não se estabeleceu e isso ainda vai levar muito tempo. Apenas um filme ou outro acaba virando destaque internacional e consequentemente terá uma carreira mais longa.
O FUTURO
- Está com algum projeto em andamento?
Estou finalizando o longa metragem “Música & Violência” que conta a história de quatro músicos matadores de aluguel em Curitiba. Este filme ainda não tem previsão de lançamento.
- Qual o seu sonho?
Creio que é necessário dar continuidade ao trabalho que iniciamos ainda quando garotos. Vamos continuar trabalhando a partir dessa necessidade de expressão cultural, seja através da imagem ou de novas plataformas tecnológicas. Meu sonho é continuar produzindo, independente das circunstâncias.
Além de cineasta sou jornalista por formação e quero desenvolver projetos que envolvam o cinema e o jornalismo, que também é minha grande paixão. Estou também muito focado na literatura. Em breve lanço o meu primeiro romance intitulado “Cidade dos Monges”, inspirado no período em que trabalhei na Europa como correspondente internacional para a revista Bem Público. O sonho é um importante estimulante para materializar aquilo que almejamos.
O cineasta Willy também trabalha em sua produtora "041 Cine & Vídeo" e possui uma coluna no site Paraná Online.
Produção: Rubia Oliva e Julio Glodziesnki
Texto: Letícia Donadello
Correção: Virginia Crema e Aline Przybysewski
Edição: Etiene Mandello
Correção: Virginia Crema e Aline Przybysewski
Edição: Etiene Mandello
Imagens: Divulgação
041 Cine & Vídeo
China em foco, festival de cinema visa promover a liberdade no país
A China foi o foco principal num evento cinematográfico anual no último fim de semana em Ottawa, Canadá, que celebrou documentários corajosos e questionadores e envolveu o público num sério debate, algo que os organizadores sentem faltar em muitos eventos.
Entre suas seleções deste ano, o 3º Festival Anual de Cinema do Pensamento Livre apresentou dois filmes interessantes sobre a China que visam conscientizar e discutir questões fundamentais como liberdade, democracia e direitos humanos.
‘Morte pela China: Um emprego perdido por vez’ (‘Death by China: One Lost Job at a Time’) analisa o custo para os EUA de sua relação comercial com a China, com destaque para os desequilíbrios comerciais crescentes, as práticas desleais de comércio do regime e as consequências nos EUA, como o fechamento de fábricas, o desemprego e o aumento da dívida detida pela China.
‘China Livre: A coragem de acreditar’ (‘Free China: The Courage to Believe’) é um documentário premiado que conta as histórias de Jennifer Zeng e Charles Lee, que foram presos na China por sua crença na prática espiritual do Falun Gong e sobreviveram à tortura e ao trabalho forçado.
O festival, realizado na Biblioteca e Arquivos do Canadá entre 1º e 4 de novembro, foi apresentado pela Sociedade Cinematográfica do Pensamento Livre.
Sem respeito pelo próprio povo
“Eu quis dar a China um grande foco em nosso festival deste ano para que os canadenses possam ver por si mesmos os abusos dos direitos humanos, as práticas retratadas da China e para colocarem alguma pressão sobre o governo canadense no sentido de trabalhar pela democracia e a liberdade do povo chinês”, disse Fred Litwin, o presidente e fundador da sociedade.
“Isso é que é importante e esse é o meu objetivo”, acrescentou Litwin, falando com a emissora NTDTV em 2 de novembro na exibição de “Morte pela China”.
Num painel de debates após a exibição, Greg Autry, coautor e produtor de ‘Morte pela China’, falou sobre a ausência de direitos dos trabalhadores e das normas de trabalho na China.
“[A China] não respeita seu próprio povo”, disse ele. “As centenas de milhares de pessoas que são mutiladas e mortas a cada ano na indústria e extrativismo [de mineração] na China deveriam deixar os canadenses arrepiados.”
David Kilgour, ex-secretário de Estado (Ásia-Pacífico), destacou o risco que os investidores estrangeiros enfrentam ao fazerem negócios na China, observando o caso de uma empresa que perdeu milhões de dólares de investimento quando foi de repente “privatizada” por oficiais do governo.
“Eu não investiria um centavo na China até chegar o Estado de direito”, disse Kilgour.
Jennifer Zeng, que vive na Austrália atualmente, mas esteve em Ottawa para participar de ambas as exibições, descreveu as atrocidades sofridas pelos prisioneiros nos campos de trabalho chineses.
“[Os guardas] inventaram uma maneira de usar duas escovas de dente colocadas juntas com as cerdas para fora e empurrá-las dentro da vagina de praticantes do Falun Gong e torcer e torcer até virem sangue sair”, disse ela.
“Tortura sem fim é uma parte de nossa vida nos campos de trabalho.”
‘China Livre’ também descreveu como praticantes do Falun Gong foram selecionados para terem seus órgãos e condição física examinados sob custódia. Resultados de investigações independentes concluíram que o regime chinês está envolvido na colheita forçada de órgãos sistemática e em grande escala de prisioneiros da consciência do Falun Gong para abastecer um comércio de órgãos lucrativo.
“A esperança está na educação”
O parlamentar conservador Bryan Hayes participou da exibição de ‘China Livre’ no sábado.
Numa entrevista com a NTDTV, ele comentou sobre o sistema de prisão de trabalho forçado retratado no filme que produz artigos vendidos no Ocidente, como chinelos Bart Simpson e luzes de Natal.
“Entender o que realmente está acontecendo foi perturbador, muito perturbador”, disse ele, e acrescentou, “A esperança está na educação”.
“Divulgar o que realmente está acontecendo [...] é extremamente importante, porque as pessoas precisam ver, as pessoas precisam ouvir.”
Fonte
www.epochtimes.com.br
Fonte
www.epochtimes.com.br
terça-feira, 16 de outubro de 2012
Prêmio Estadual de Cinema e Vídeo volta a ser disputado em 2012
Sem acontecer desde 2008, o prêmio volta com o valor de 1,5 milhão que será dividido para produção de um longa e três curtas
Cena do filme Curitiba Zero Grau
Cena do filme Curitiba Zero Grau
Os
produtores de cinema do Paraná têm mais um motivo para comemorar nesse ano: o
Prêmio Estadual de Cinema e Vídeo, que foi esquecido por algum tempo no
calendário cultural do Paraná, abre suas inscrições novamente e está
disponibilizando um alto valor para os ganhadores. Instituído por meio da Lei
n.º 14.279, o valor total soma R$ 1,540 milhão para a produção de quatro
filmes, sendo um longa metragem e três telefilmes. Entre as modalidades, podem
concorrer: ficção, documentário, animação e também temática livre.
O
objetivo da criação do prêmio é fomentar o desenvolvimento audiovisual no
Paraná, aumentando a produção e fornecendo recursos para os realizadores
criarem obras de valor artístico competitivas no circuito comercial, explica
Fernando Severo, cineasta e diretor do Museu de Imagem e do Som do Paraná. Ele
conta também, que o valor recebido pelo ganhador só pode ser usado para
produção do filme, a divulgação será um custo à parte.
As
questões mais discutidas acerca do prêmio são o fato do valor ser insuficiente
para produção e não receber reajuste desde o início de sua criação, e também
por que aconteceu somente três vezes em um período de oito anos. Segundo a
secretaria da cultura, em 2011 o orçamento precisou ser alterado por conta das
enchentes no litoral do estado. Já nos anos anteriores a gestão era diferente
da atual. A correção do valor só poderá ser feita com alteração na lei, que só
estabelece o montante e não prevê a correção.
As
inscrições estão abertas desde o dia 16 de agosto e seguem até 05 de outubro de
2012 e, para concorrer ao prêmio, os projetos propostos devem, obrigatoriamente,
ser inéditos, além de atender aos seguintes requisitos: ter registro na Ancine
(Agência Nacional de Cinema), a produtora deve estar sediada no Paraná há no
mínimo dois anos, o elenco do filme deve ser composto por pelo menos 70% de
atores paranaenses e, por fim, o diretor e mais três componentes da equipe
devem residir no Paraná.
Esse
incentivo às produções paranaenses acontece desde 2004. Entre os filmes que
foram premiados nas edições passadas, estão os longas, “Corpos Celestes”, de
Fernando Severo e Marcos Jorge, “Mistéryos”, dirigido por Beto Carminatti e
Pedro Merege Filho e "Curitiba Zero Grau", de Eloi Pires Ferreira,
que estreou recentemente nos cinemas. Além deles, também foram premiados
curtas, documentários e telefilmes.
Em
entrevista ao blog, quando questionado sobre o espaço de tempo entre as
edições do prêmio e o valor dele, Eloi Pires Ferreira, diretor do último filme
vencedor, diz que, nesse caso, “o próprio estado não está respeitando a
legislação”. Para o diretor as lacunas deixadas durante os anos que não houve
edição, prejudicaram a cena cinematográfica paranaense, pois diversas obras não
puderam ser produzidas. Eloi destaca que além de termos mais filmes no Paraná,
quem trabalha na área estaria praticando, aprendendo mais, assim como o setor
estaria gerando mais empregos e movimentando a economia. “O cinema é algo caro
de se fazer, mas consolida cultura, e tem a característica de ser uma atividade
estratégica, inclusive economicamente”, salienta. A respeito dos valores, ele afirma que estão
baixos para produção: “Estes valores são os mesmos desde que o Prêmio foi
criado, em 2004. Deveria existir um indexador, que reajustasse o valor a cada
ano. Gastamos cerca de R$ 1.300 milhão com a finalização do filme, eu e os
outros produtores, acabamos tendo que utilizar dinheiro próprio”.
O diretor
ainda conta que hoje seria impossível realizar uma produção com o porte da sua,
com o valor oferecido pelo Prêmio. “Se considerarmos valores de um filme como
esse, orçado nos padrões do eixo Rio - São Paulo ficaria entre dois ou três
milhões de reais”, acrescenta. Segundo o diretor, uma série de imprevistos
acaba deixando o filme mais caro. Além disso, à medida que o tempo vai
passando, pela lógica da economia, os preços de diversos produtos e outros
fatores, como mão de obra, materiais de produção, entre outros, acabam
aumentando.
Os
interessados em concorrer ao prêmio devem conferir todas as informações no site
da Secretaria da Cultura (www.cultura.pr.gov.br) e ficar atentos. Após fazer a
inscrição cumprindo as regras estabelecidas pelo Edital, é necessário aguardar
o julgamento dos projetos que é feita da seguinte maneira:
Inicialmente eles passam por uma comissão de credenciamento, que analisa
se estão de acordo com essas regras. Feito isso, os projetos habilitados são
encaminhados para uma comissão de avaliação que é composta por
três membros, indicados pelas entidades de classe e pela Secretaria de
Estado da Cultura, explica Fernando Severo.
Projetos
já contemplados
Na primeira
edição, em 2004, foram selecionados o longa “Corpos Celestes”, de Fernando
Severo e Marcos Jorge, e os curtas “Caminho da Escola”, de Heloisa Passos,
“Made in Ucrânia – Os Ucranianos no Paraná”, de Guto Pasko, e “O Coro”, de
Werner Schumann. Na segunda edição, em 2005, “Mistéryos”, longa dirigido por
Beto Carminatti e Pedro Merege Filho, e os telefilmes “Belarmino e Gabriela”,
de Geraldo Pioli,“Guerra Dentro da Gente”, de Paulo Munhoz, e “Amadores do
Futebol”, de Eduardo Baggio.
Em 2008,
na terceira edição do Prêmio Estadual de Cinema, os três telefilmes
classificados foram "Deserto D'Água", documentário de Heloisa Passos,
"Geada Negra", documentário de Adriano Luís Andrade Justino, e
"Gol a Gol", ficção de Adriano Esturilho e Fábio Allon. Além destes,
foi contemplado o longa-metragem “Curitiba Zero Grau”, com direção de Eloi
Pires Ferreira, que estreou nos cinemas no dia 17 de agosto desse ano.
“Curitiba
Zero Grau”, conta a história de quatro personagens, cada qual com rotinas e
realidades diferentes, mas que durante o decorrer do filme acabam se
relacionando de alguma forma. Como o próprio nome remete, a ficção se passa em
Curitiba, em uma típica semana fria da cidade. Cada personagem tem o núcleo de
seu cotidiano parecido, trabalho, família, dilemas pessoais. Porém o fator
econômico, a forma como cada um toma suas decisões e levam suas vidas, os
diferencia.
segunda-feira, 1 de outubro de 2012
'Antiespetáculo' marca documentário sobre Jards Macalé
De Eryk Rocha, 'Jards' estreia no Festival do Rio nesta segunda (1º). Longa é um dos dez concorrentes da mostra competitiva Première Brasil.
Henrique Porto
Quando recebeu o convite de Jards Macalé para registrar em imagens o processo de produção de "Jards", mais recente álbum do cantor e compositor carioca, o cineasta Eryk Rocha já sabia o que fazer. "Queria que as músicas falassem, que os instrumentos virassem personagens. E que eu pudesse contar esta história através do corpo do Macalé. E isso é muito mais revelador do que uma entrevista", explica o diretor. Pois assim é o documentário homônimo ao disco gravado em 2011, parceria do Canal Brasil com a Biscoito Fino que estreia no Festival do Rio nesta segunda-feira (1º), em sessão de gala a ser realizada no Cine Odeon, às 17h.
Henrique Porto
Do G1 Rio
O cantor e compositor Jards Macalé, artista retratado pelo cineasta Eryk Rocha em 'Jards': filme compete na mostra Première Brasil de documentários do Festival do Rio (Foto: Divulgação)
De fato, não há depoimentos ao longo dos cerca de 90 minutos de projeção. Os únicos diálogos capturados pelas câmeras regidas pelo filho do também cineasta Glauber Rocha (1939-1981) são do artista com seus músicos e, destes, com seus instrumentos. As imagens de arquivo também são esparsas: exibem apenas um Jards granulado em negativos de Super 8, em imagens resgatadas junto ao próprio acervo pessoal do cantor e filmadas no período do exílio em Londres — época em que também gravou o cultuadíssimo "Transa", de Caetano Veloso.
À medida que o filme avança, muito pouco é revelador. A fotografia é subexposta em microdetalhes, sombras e supercloses que, por vezes, dificultam o reconhecimento do personagem em questão (são inúmeras as participações especiais, que incluem Luiz Melodia, Frejat, Thais Gulin e Adriana Calcanhotto). Saltam na tela poros, olhos, dentes, teclas de piano, baquetas e partituras incompletas. "É uma câmera epidérmica, cinema de pele. As imagens não são realistas nem claras. É proposital, uma espécie de antiespetáculo", define Eryk. "Muitas vezes os filmes musicais têm essa coisa de mostrar um produto pronto. Meu interesse é outro: poder desmistificar um pouco o idealismo que se construiu em relação ao processo de criação de um artista. E colocar o espectador num processo de imersão." Mas e o artista retratado? O que achou do resultado? "O filme me pega por um ângulo mais íntimo, que trata justamente do meu trabalho. E, como é um trabalho afetivo, gostei muito. Comprei até um home theater, para ouvi-lo melhor", diz Macalé, celebrando o olhar do diretor sobre seu processo criativo. "Eu adoro o incomum. Se não fosse assim, acharia uma merda", sentencia.
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segunda-feira, 24 de setembro de 2012
Festival de Cinema de Sergipe premia melhores filmes exibidos
Cerimônia foi comandada mais uma vez pelo ator Flávio Bauraqui.
G1 - portal de notíciasNa noite do último sábado (22), ocorreu a cerimônia de premiação do Festival Iberoamericano de Cinema de Sergipe (Curta-SE), no Teatro Atheneu, onde o público e júri escolheram as obras favoritas. Comandada mais uma vez pelo ator Flávio Bauraqui, a cerimônia foi antecedida pelo espetáculo teatral ‘A Farsa dos Opostos’, do Grupo Imbuaça de teatro de rua.
Dentre os longas-metragens, o pernambucano ‘Febre do Rato’, de Cláudio Assis, saiu-se como o grande vencedor da noite, levando para casa os prêmios de Melhor Longa-Metragem pelo Júri Oficial e pelo Júri Popular, Melhor Atriz pelo Júri Oficial (Mariana Nunes) e Melhor Fotografia.
Enquanto isso os outros longas ganharam um prêmio do Júri Oficial cada. ‘Girimunho’, de Clarissa Campolina e Helvécio Marins levou para casa o prêmio de Melhor Direção; ‘Eu Receberia As Piores Notícias dos Seus Lindos Lábios’ ficou com o Melhor Ator (Gustavo Machado); enquanto que ‘Paraíso Aqui Vou Eu’, de Cavi Borges e Walter Daguerre ganhou a Menção Honrosa pela incrível trilha sonora de Plínio Profeta.
Entre os curtas metragens ibero-americanos, rodados em 35mm, destacou-se a performance ‘Casa Afogada’, de Gilson Vargas, ‘Barbeiros’, de Luiz Ferraz e Guilherme Aguillar, e ‘Três Vezes por Semana’, de Cris Reque. Todos os três ganharam dois prêmios do Júri cada. O filme gaúcho de Gilson Vargas ganhou os prêmios de Melhor Curta-Metragem, Melhor Curta-Metragem de Ficção; Já ‘Barbeiros’, levou Melhor Curta-Metragem Documentário e Melhor Direção; enquanto isso, ‘Três Vezes por Semana’ foi premiado com Melhor Atriz (Irene Brietzke) e Menção Honrosa 35mm.
Já os outros vencedores, tiveram um prêmio do Júri Oficial. O espanhol ‘Zeinek Gehiago Iraun’, de Gregorio Muro, levou o Melhor Curta-Metragem de Animação; o baiano ‘Premonição’ de Pedro Abib ficou com Melhor Curta com Temática Nordestina; o fluminense ‘Uma, Duas Semanas’ de Fernanda Teixeira com premiado com Melhor Ator (Silvio Matos); o paulista ‘Funeral À Cigana’ de Fernando Honesko, levou a Menção Especial.
O primeiro prêmio de Melhor Fotografia em 35mm pelo Júri Oficial do Curta-SE foi para o fluminense ‘Quando Morremos À Noite’ de Eduardo Morotó. Enquanto isso, a escolha do público premiou o paulista ‘Café Turco’, de Thiago Luciano, como Melhor Curta-Metragem 35mm pelo Júri Popular.
Nas categorias que envolvem os vídeos ibero-americanos, o paulista ‘Realejo’, de Marcus Vinícius Vasconcelos, ganhou os prêmios de Melhor Vídeo Animação pelo Júri Oficial e Melhor Vídeo Ibero-americano pelo Júri Popular. O espanhol ‘La Miranda Perdida’ de Damián Dionísio levou o prêmio de Melhor Vídeo Ibero-americano pelo Júri Oficial. Já o carioca ‘O Brasil de Pero Vaz de Caminha’ de Bruno Laet ganhou o Melhor Vídeo Documentário e o paranaense ‘A Fábrica’, de Aly Muritiba, ganhou Melhor Vídeo Ficção, ambos também pelo Júri Oficial.
Os jurados também concederam duas menções honrosas aos vídeos iberoamericanos. Uma delas foi para o sergipano ‘Meia Noite’, de Samuel Blá, por atestar a evolução da qualidade de produção audiovisual sergipana, sendo bem realizado e de fácil comunicação com o público. Já o paulista ‘A Noite dos Palhaços Mudos’, de Juliano Luccas, foi premiado pela soma de diversos elementos que compõem a narrativa cinematográfica com notória qualidade, tais como: fotografia, direção de arte, atuação e efeitos.
O júri oficial também premiou ‘Meia Noite’ como o Melhor Vídeo Sergipano. Já ‘Derredor’ de André Aragão foi agraciado como o 2º Melhor Vídeo Sergipano e foi eleito Melhor Curta Sergipano pelo Júri Popular. ‘Rezou A Família e Foi Ao Cinema’, feito pelos alunos do Núcleo de Produção Digital Orlando Vieira (NPDOV) ficou o 3º lugar.
Entre os videoclipes, ‘O Deus Que Devasta Mas Também Cura’ do baiano Lucas Santtana, dirigido por Daniel Lisboa e Matheus Viana recebeu o prêmio do Júri Oficial de Melhor Videoclipe, enquanto ‘Tá Certo’ da banda sergipana Ode Ao Canalha, dirigido pelos alunos do NPDOV foi o favorito do público, levando o mesmo prêmio só que do Júri Popular. Já o sergipano ‘Ao Seu Lado’, de André Aragão foi eleito pelos internautas como Melhor Vídeo de Bolso.
Terminada a entrega de prêmios, as diretoras executivas do Curta-SE agradeceram aos presentes e homenagearam a equipe do festival, por ter garantido o entretenimento do espectador e ter proporcionado a diversão e o conforto aos cinéfilos. O encerramento do Curta-SE 12 foi realizado pouco depois da premiação, no Oceanário de Aracaju, com apresentações musicais de Lena Oliver e NaurÊa.
Após muitas emoções no telão, chega ao fim mais uma edição do Festival Iberoamericano de Cinema de Sergipe (Curta-SE). Pela 12ª vez, o festival sergipano atraiu olhares do público de casa e do resto do país, ao levar para o espectador, uma incrível programação de filmes, comovendo a plateia e oferecendo o entretenimento em suas variadas formas, não só o cinema, mas também a música e o teatro.
Para saber um pouco mais confira este link:
G1
sexta-feira, 22 de junho de 2012
Dia do Cinema Brasileiro
Você sabia que 19 de junho é considerado o Dia do Cinema Brasileiro? E você sabe o motivo?
Muita gente pensa que trata-se do dia em que foi realizada a primeira sessão de cinema no Brasil, mas não é o caso. Tal sessão ocorreu em um 8 de julho de 1896, no Rio de Janeiro. A data, na verdade, destaca a ocasião das filmagens do primeiro filme nacional, Vista da Baia da Guanabara, do cinegrafista italiano Afonso Segreto, que foi rodado em 19 de junho de 1898.
Desde então, se passaram 114 anos e o cinema brasileiro viveu muitos altos e baixos para hoje ser apontado como um dos mais diversificados do mundo. São poucas cinematografias que podem se dar o luxo de lançar obras tão diferentes como E Aí... Comeu? e Febre do Rato num mesmo dia, o que irá acontecer hoje (22).
Filme "Alô, Alô Carnaval"
O cinema nacional caiu no gosto popular nas décadas de 30 e 40, a partir da chegada do som e da industrialização. Filmes como Limite, Ganga Bruta, Alô, Alô Carnaval e O Ébrio são lembrados até hoje. Nos anos 50, tivemos as chanchadas da Atlântida, com destaque para O Homem do Sputnik, e os longas de Amácio Mazzaropi.
Procurando romper com esta vertente popular da sétima arte, o Cinema Novo chegou fazendo barulho nos anos 60 a partir de obras como Vidas Secas, Deus e o Diabo na Terra do Sol, Os Fuzis, Terra em Transe e muitos outros. Isso sem falar em O Pagador de Promessas, que conquistou a Palma de Ouro do Festival de Cannes.
Imagem do filme "O Bandido Da Luz Vermelha", de Rogerio Sganzerla, 1968
O realismo do Cinema Novo continuou com muito espaço e influenciando muita gente na década de 70. Mas o movimento já não estava sozinho e acabou encontrando a companhia do Cinema Marginal de Rogerio Sganzerla (O Bandido da Luz Vermelha) e Julio Bressane (Matou a família e foi ao cinema).
A partir do final dos 70 e início dos 80, os filmes brasileiros passaram a ganhar mais destaque nas bilheterias. Dona Flor e Seus Dois Maridos levou quase 11 milhões de espectadores aos cinemas, num recorde que só foi superado porTropa de Elite 2. A Dama do Lotação e Lúcio Flávio, o Passageiro da Agonia foram assistidos por mais de 5 milhões de pessoas. Também não podemos esquecer dos Trapalhões, que possuem 15 filmes dentre as 30 maiores bilheterias de todos os tempos no Brasil.
Filme Cidade de Deus, dirigido por Fernando Meireles, 2002
Após sofrer com o final da Embrafilme no início dos anos 90, o cinema nacional voltou a respirar em 95, com os lançamentos Terra Estrangeira e, principalmente, Carlota Joaquina, Princesa do Brasil. Daí surgiu a chamada Retomada, cujos principais destaques de público foram Central do Brasil, Cidade de Deus, Carandiru, 2 Filhos de Francisco, Se Eu Fosse Você 2 e Tropa de Elite.
Fonte: AdoroCinema
Fotos: divulgação
terça-feira, 19 de junho de 2012
sexta-feira, 8 de junho de 2012
O cinema como instrumento de crítica social e
política
Cena do filme O Pagador de Promessas, de 1962
Fonte: cinecaleidoscopio.com.br
Nos anos 60 houve uma efervescência política e
cultural no mundo. No Brasil, Jânio Quadros estabeleceu relações diplomáticas
com a União Soviética e assumiu uma postura de simpatia à Revolução Cubana. Com
sua renúncia e a posse de João Goulart foi lançado um plano de reformas de base
(agrária, urbana e tributária) que incentivou a organização de estudantes,
trabalhadores e das Ligas Camponesas.
O cinema brasileiro refletiu isso adotando uma
postura de engajamento político e uma estética inovadora que, por seu caráter
transformador, acompanhava o desejo da revolução política. Influenciados pelo
neo-realismo e pela nouvelle vague, os cineastas brasileiros optaram por
produzir filmes de baixo orçamento, com a utilização de câmeras leves e sem o
apoio de tripés, seguindo o postulado da “câmera na mão e uma idéia na cabeça”.
Como um cinema-denúncia, os filmes discutiam a situação política, social e
econômica do país, sempre com uma visão crítica de esquerda, voltada para a
busca de uma identidade nacional. Não era difícil, portanto, encontrar nas
instituições políticas o interesse de utilizar o cinema como ferramenta
revolucionária.
Foi assim que os Centros Populares de Cultura da
UNE financiaram os filmes Cinco Vezes Favela – dirigido por Marcos Farias,
Miguel Borges, Carlos Diegues, Joaquim Pedro de Andrade e Leon Hirszman – e
Cabra Marcado Para Morrer, de Eduardo Coutinho. Interrompido pela censura
durante a ditadura, o filme de Coutinho discute a história das Ligas Camponesas
combinando características do ”cinema direto” (entrevistas, dados verídicos e
documentais, além da presença ativa do diretor nas cenas) com a ficção,
inserindo atores no papel de personagens reais. O filme foi lançado apenas em
1984, recebeu doze prêmios e introduziu o diretor na produção documental
brasileira. Coutinho é considerado um dos principais cineastas em atividade
hoje.
Entre os anos de 1962 e 64 os filmes enfatizaram o
nacionalismo, em busca de uma identidade nacional em contraposição ao
imperialismo norte-americano. Por isso, os olhares dos diretores se voltaram
para o sertão. Seguindo esta temática, ocorreu um surto baiano, que lançou
Bahia de Todos os Santos, de Trigueirinho Neto, e O Pagador de Promessas, de
Anselmo Duarte, primeiro filme brasileiro a receber uma Palma de Ouro, em 1962.
Também são marcos Vidas Secas, adaptação de Nelson Pereira do Santos para a
obra homônima de Graciliano Ramos, Os Fuzis, de Ruy Guerra, vencedor do Urso de
Prata de 1965, e Barravento, estréia de Glauber Rocha. No entanto, foi com Deus
e o Diabo na Terra do Sol (1964), que Glauber ganhou reconhecimento e prestígio
internacional.
O golpe militar contra João Goulart deu início à
ditadura no Brasil, em 1964, regida por atos institucionais e emendas que
suspendiam direitos políticos, sociais e civis. Com o nacionalismo em baixa, as
cidades pareciam concentrar as contradições mais evidentes e a possibilidade de
uma revolução. Começou uma nova fase dos cinemanovistas, que abandonaram a
temática do sertão para voltar os olhos para os grandes centros urbanos,
originando filmes como A Grande Cidade, de Carlos Diegues, e São Paulo S/A, de
Luiz Person. Desta mesma época são Menino de Engenho, de Walter Lima Jr., A
Falecida, de Leon Hirszman, Integração Racial, de Paulo César Saraceni e
Opinião Pública, de Arnaldo Jabor.
Durante a década de 60 foram desenvolvidas diversas
iniciativas de regulamentação das atividades do cinema, algumas governamentais
e outras de profissionais diretamente relacionados ao campo artístico. Em 1965, foi criada a Difilm, uma sociedade de
cinco empresas, das quais os principais diretores do Cinema Novo eram
proprietários em uma “iniciativa de unir produtores de filmes de longa-metragem
em torno de uma empresa distribuidora e co-produtora cinematográfica comercial”.
Foi responsável pelo lançamento de filmes de Walter Lima Júnior, Glauber Rocha,
Paulo César Saraceni, Carlos Diegues entre outros, somando um total de cerca de
30 títulos. No entanto, conseguiu seus maiores êxitos de bilheteria com Roberto
Carlos em Ritmo de Aventura, Roberto Carlos e o Diamante Cor de Rosa e
Macunaíma, o que gerou conflitos internos que levaram a sua extinção em meados
de 1974.
Em 1966, um projeto iniciado no segundo governo de
Getúlio Vargas e discutido nos congressos de cinema de 1952 foi reelaborado
para finalmente se concretizar com a criação do Instituto Nacional de Cinema
(INC), órgão que incorporou o Instituto Nacional de Cinema Educativo e cujos
objetivos eram fiscalizar e normatizar assuntos referentes ao cinema nacional.
Já em 1969 foi criada a Embrafilme, agência de capital misto controlada
majoritariamente pela União, para exercer atividades complementares ao INC. Em
1975, suas funções foram ampliadas – controlava agora os setores comercial,
industrial e cultural – a tal ponto que o INC foi extinto. Neste período, a
quota de exibição de filmes brasileiros aumentou “criando um mercado de 63
dias/anos em 1969 que evoluiu até 112 dias/ano em 1975 (30,6% do tempo total).
Além disso, estimulou a multiplicação de salas exibidoras, que saltaram de 829,
em 1967, para 3.276, em 1975”.
No mesmo ano da inauguração da Difilm, Glauber
Rocha publicou “Uma Estética da Fome”, manifesto que inaugurou uma nova ética e
estilo de representar a pobreza e a violência. Em 2000, após o lançamento do
filme Cidade de Deus, a pesquisadora Ivana Bentes criou o termo “Cosmética da
fome” para denominar a estética de filmes contemporâneos como o de Fernando
Meirelles. Ismail Xavier afirma que a “estética da fome” transformava a técnica
em linguagem de cinema, pois “a carência [de recursos] deixa de ser um
obstáculo e passa a ser assumida como fator constituinte da obra, elemento que
informa a sua estrutura e do qual se extrai a força da expressão”.
Uma maneira de compreender o contexto político e
cultural é observando as formas assumidas pela censura com o passar do tempo.
Após o golpe ditatorial a censura teve um papel de defesa da moral católica,
ocupava-se em cortar palavrões e cenas de insinuação de sexo. Deus e o Diabo Na
Terra do Sol, por exemplo, faz parte deste período em que a restrição era feita
por faixas etárias. Foi proibido para menores de 18 anos pelos diálogos e cenas
violentas. Uma das fichas de censura, datada de junho de 1964, indica que “a
película mostra em demasia a pobreza brasileira, onde não há razão, de deixarem
rodar em outros gabinetes estrangeiros, para não ridicularizar o nosso paíz”.
Já no parecer de José Vieira Madeira ao chefe do Serviço de Censura de
Diversões Públicas (SCDP), afirma-se que “como realização artística e intelectual,
o filme é perfeito. Como trabalho técnico, entretanto, temos assinaladas
algumas falhas (...)”. Interessante notar que o censor tem consiência da
postura crítica de Glauber e escreve que houve um desrespeito às autoridades em
trechos de Revisão Crítica do Cinema Brasileiro, livro de autoria do cineasta,
no qual os censores são chamados de ‘polícias ignorantes’.
A edição do AI-5, em 1968, acabou com as garantias
constitucionais e fortaleceu ainda mais o órgão censor, no qual os cargos foram
assumidos por militares. Segundo Leonor Souza Pinto, “com o acirramento na
sociedade civil de resistência ao golpe, o perfil da censura muda. Surge nos
processos menção a questões de ordem política. Termos como ‘subversão’,
‘ditadura’, ‘governo popular’, ‘revolução’ se tornam comuns”. Terra em Transe
(1967), outro marco na filmografia de Glauber Rocha, explorou planos-seqüência,
diálogos longos e alegorias discutindo um país chamado Eldorado, governado por
um déspota, em clara alusão a condição ditatorial a qual estava submetido o
Brasil. O filme foi censurado conforme o parecer de Romero Lago, então chefe do
SCDP, pelo “modo irreverente com que é retratada a relação da Igreja com o
Estado”, por conter “uma mensagem ideológica contrária aos padrões de valores
culturais ou coletivamente aceitos no País”, por “ser a tônica do filme a
prática da violência como forma de solução de problemas sociais” e pela
“seqüência de libertinagem e práticas lésbicas inseridas” nele.
Com o decreto do AI-5, a censura passou a fazer
perseguições políticas e os filmes se tornaram cada vez mais complexos, em uma
tentativa de transmitir mensagens ideológicas por meio de simbologia. A
utilização de metáforas e alegorias herméticas gerou um progressivo afastamento
do público dos cinemas e o desinteresse dos exibidores. São desta época Cabeças
Cortadas, de Glauber Rocha, Quando o Carnaval Chegar, de Carlos Diegues e
Macunaíma, de Joaquim Pedro de Andrade. A linguagem de vanguarda e as inovações
estéticas propostas no Cinema Novo não alteraram a produção ou a circulação dos
filmes. Neste sentido, os diretores – jovens de classe média, escolarizados, que
pensavam o cinema como forma de militância, reflexão, crítica e conscientização
política – se afastaram do grande público.
Fonte: cinecaleidoscopio.com.br
sábado, 2 de junho de 2012
O incompreendido Terra em Transe
"Terra em Trase", talvez não seja o filme mais compreendido dos tempos do Cinema Novo. De fato a leitura de sua narrativa não é fácil e nem assimilada de pronto. Mas é um ícone dos filmes do Cinema Novo e enfrentou sérias controvérsias quando foi lançado em 1967, por Glauber Rocha. O diretor traduziu a realidade política do Brasil, dos anos 1960-1966 para um filme fictício. Situa suas personagens no país latino-americano Eldorado. O filme constrói a história de ascensões e lutas pelo poder da República de Eldorado, enlaçados pelo triangulo amoroso de Paulo Martins, o jornalista idealista e poeta ligado ao político conservador, a meretriz Sílvia e o seu amante o tecnocrata Porfírio Diaz.
O filme metaforiza em seus personagens diferentes tendências políticas presentes no Brasil da época. Realiza uma exaustiva crítica de todos aqueles que participaram desse processo, incluindo as diferentes correntes da chamada esquerda brasileira. Isto foi um dos motivos pelos quais foi tão mal recebido pela crítica e pelos intelectuais nacionais.
O recebimento não foi acolhedor. Em abril de 1967 o filme foi proibido em todo território nacional, com a argumentação de ser considerado subversivo e irreverente com a Igreja e só foi liberado com a condição de que fosse dado um nome a personagem do padre interpretado por Jofre Soares.
Hoje o filme é reconhecido como um marco na história do Cinema Brasileiro e é preciso compreende-lo. Segundo
o coprodutor e diretor de fotografia Luis Carlos Barreto, em entrevista a Folha de S. Paulo o problema da compreensão não está na linguagem do filme, mas na mente do público brasileiro que não consegue compreender novas narrativas diversas das quais já está tão acostumado:
"Por ser um filme sem concessões, caótico, polemico, feito sem a intenção de agradar a quem quer que seja, a ele e ao autor são lançadas as maiores acusações, reacionárias no mais amplo sentido da palavra. A visão do grande publico brasileiro está condicionada, parada no tempo, acostumada a linguagem simplista, estacionada no "E o Vento Levou". Enquanto isso, "Terra em Transe" marca a divisão de duas épocas, e sua tentativa de criar uma linguagem nova chega a chocar, não é aceita de imediato. As acusações são iguais àquelas dos velhos professores de Carlos Drumond de Andrade, quando o rejeitavam. Pela mesma experiência passou Oscar Niemeyer, alvo do mesmo reacionarismo". O certo entende Barreto, é que o filme não deixa de ser discutido e, como matéria de debate, Glauber Rocha coloca a velha questão: se o cinema deve ficar estagnado ou deve prosseguir inovando e investigando. "Terra em Transe" é mais um marco na historia do cinema, e principalmente no Terceiro Mundo quem quiser fazer cinema terá de enfrentar o desafio de meu diretor".
Quem sabe devamos nos concentrar um pouco no cinema brasileiro e conhecendo nossos filmes, entender melhor nossa história e nossa realidade. Os filmes, são uma das traduções da realidade, uma das linguagens usadas para transmitir nossas crenças, é preciso compreende-los.
Confira do filme na íntegra em: http://www.youtube.com/watch?v=RUlSBE7Z-1g&feature=related
Confira do filme na íntegra em: http://www.youtube.com/watch?v=RUlSBE7Z-1g&feature=related
sábado, 19 de maio de 2012
Quem tem medo de
Glauber Rocha?
Perdão, leitores, mas esse texto poderá estar como a maioria das pessoas imagina um filme de Glauber Rocha: longo, incompreensível e por demais chato. Mas não desistam, pois esse que é o maior nome do cinema brasileiro merece sua atenção.
Por que Glauber Rocha causa ojeriza ainda hoje? Por que a juventude e seu gosto pelo cinema de hoje fogem dele sem mesmo o conhecer? Por que combatê-lo, defenestrá-lo sem olhar atentamente à sua obra e buscar nela algo de útil e substancial para o cinema e para o Brasil?
Ofereço a vocês, caros, a chance de conhecer um pouco mais de Glauber Rocha e, assim, poder surrá-lo à exaustão. E não se importem se o texto está enaltecendo Glauber: órfãos de Glauber sempre vão existir, assim como saudosos da ditadura e eleitores do Maluf. Afinal, a democracia é feita da pluralidades de opiniões e pensamentos.
Genialidade e loucura, eis Glauber Rocha
Para Glauber, cinema era política. Sua obra pode ser dividida em três fases: num primeiro momento, a fase revolucionária, que abarcaria o início da carreira, quando filma o curta O Pátio ainda no Colégio Central de Salvador, até a conclusão de Terra em Transe, que seria a reavaliação de Glauber para as esquerdas no Brasil e sua relação com o Golpe Militar de 1964; uma segunda fase que se pode chamar de estrangeira, começando com o curta de estética marginal Câncer, passando por seu maior êxito comercial, O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro e desembocando nas produções estrangeiras realizadas no exílio no decorrer dos anos 70 – Cabeças Cortadas, O Leão de Sete Cabeças, História do Brasil e Claro; finalmente, a volta do exílio, a fase final de sua trajetória, mais voltada ao experimentalismo. Fazem parte desta o curta Di-Glauber, o média-metragem Jorjamado no Cinema e seu filme derradeiro, o mais radical de todos, A Idade da Terra.
Da crítica cinematográfica, iniciada em Salvador no final dos anos 50, passaria às filmagens em 1960, já enturmado com a turma do cinema, quando prepara a produção de Barravento, a ser dirigida pelo amigo Luiz Paulino dos Santos. Mas logo nos primeiros dias de filmagens o gênio forte de Glauber viria à tona e um desentendimento entre eles leva Glauber a destituir o amigo do cargo e, assim, assumir a direção deste que viria a ser seu primeiro longa-metragem, só exibido no Rio de Janeiro em 1964. Barravento já dava mostras do que viria a ser seu cinema, uma obra voltada ao oprimido e que pregava abertamente a revolução. O filme narra a história de um grupo de pescadores em Buraquinho, na Bahia, que é explorado pelo dono da rede de pesca, mas, mesmo assim, mantém-se passivos diante do fato. O conflito nascerá quando Firmino, recém-chegado da cidade e vendo a situação condenatória e alienante de sua gente, tenta, a todo custo, libertar a população de sua condição passional e incitar uma revolta. Ao final, percebemos que o povo não estava preparado para a revolução, mas havia traços de que poderia vir a estar.
Em 1963, já no Rio de Janeiro, publica seu primeiro livro, Revisão Crítica do Cinema Brasileiro, onde, como o próprio nome diz, faz uma abordagem crítica da história do cinema brasileiro, criticando filmes que foram grande sucesso, como O Cangaceiro, as chanchadas e o esquema de produção industrial da Vera Cruz. Ao mesmo tempo, evoca os ideais que regeriam o Cinema Novo, fazendo um histórico do movimento que revolucionaria o cenário cinematográfico nacional. Ainda, em Revisão Crítica, Glauber elege dois cineastas como modelo de verdadeiros autores do cinema: resgata Humberto Mauro, o grande nome do cinema brasileiro desde os fins dos anos 20, e aponta o cinema social recente de Nelson Pereira dos Santos como uma tendência a ser seguida. Elogia abertamente Rio 40 Graus e o coloca como a faísca para o surgimento dos cinemanovistas.
Com esse pensamento que Glauber filma Deus e o Diabo na Terra do Sol, considerada sua obra máxima ao lado de Terra em Transe. Na verdade, ambos os filmes formam uma única obra em seu todo – caminham da esperança revolucionária demonstrada ao final de Deus e o Diabo ao desencanto niilista com o que foi da revolução após o golpe militar em Terra em Transe (sobre isso, ver minha coluna anterior publicada neste mesmo Digestivo).
Deus e o Diabo trazia à tona a revolução, preparava o povo para a tomada de poder (o filme fora lançado dias antes do Golpe de 31 de março de 1964). Como vários outros exemplares do Cinema Novo, buscava tirar o povo de sua condição submissa e colocá-lo à frente da revolução. Frente à opressão e exploração, apenas uma reação violenta se espera daquele que sofre a ação injusta. O mesmo que fez Manuel vaqueiro ao ser passado para trás pelo fazendeiro. O mesmo que fez Antônio das Mortes, o matador de cangaceiros, ao acabar com o transe alienante – o cangaço e o misticismo – em que Manuel e Rosa se meteram em sua trajetória rumo à conscientização. Depois de tudo isso, o povo poderia correr livre em direção ao mar, quando o mar viraria sertão e o sertão viraria mar.
Quando se deu o Golpe Militar no Brasil, Glauber estava em Cannes para a exibição do filme no festival. Receoso em voltar, passa uma temporada na Europa, quando apresenta seu mais famoso texto, o manifesto Estética da Fome. O colonialismo dependente latino estaria gerando a fome, e esta moveria o Cinema Novo. Escreve Glauber: “nossa originalidade é a nossa fome e nossa maior miséria é que esta fome, sendo sentida, não é compreendida”. Seria essa fome que levaria a legitimar uma reação violenta: “... a mais nobre manifestação da fome é a violência. (...) somente conscientizando sua possibilidade única, a violência, o colonizador pode compreender, pelo horror, a força da cultura que ele explora. Enquanto não ergue as armas o colonizado é um escravo...”. Essa violência estaria no que seria retratado – a verdade da miséria –, mas também no formato, no como seria filmada determinada história.
No final de 1965, Glauber volta ao Brasil e é preso, juntamente com outros seis intelectuais, quando protestavam contra a ditadura durante uma reunião da Organização dos Estados Americanos (OEA). Ele fica detido por 23 dias. No começo de 1966, vai ao Norte do país e filma Maranhão 66, um curta documental sobre a posse do governador José Sarney em que o diretor faz uma montagem paralela entre as cenas da posse e a miséria do povo. Cenas desse documentário seriam usadas em Terra em Transe, que começaria a filmar no segundo semestre do mesmo ano.
Terra em Transe nasceu do questionamento a respeito da passividade da classe média e do povo diante do Golpe Militar e se transformaria no balanço da sua própria geração. Paulo Martins é o poeta e militante que trafega pelos dois lados da política. Ora o vemos ao lado do populista Vieira ora ao lado de Porfírio Diaz, o homem de direita com tendência ditatorial. O filme é narrado em flashback, pois logo no início temos a perseguição da polícia a Paulo Martins, quando este é ferido e agoniza relembrando sua história. O filme se passa em um país fictício – Eldorado –, mas facilmente identificado como o Brasil. Mesmo os personagens têm semelhanças não coincidentes com personagens reais da vida política do período do Golpe.
O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro, filmado em 1968 e lançado no ano seguinte, seria o primeiro filme em cores e a obra de maior sucesso comercial de sua carreira, além de lhe render a Palma de Ouro de melhor diretor em Cannes. O filme recupera o personagem Antônio das Mortes, criado por Glauber em Deus e o Diabo, numa saga de perseguição ao cangaceiro Coirana que, no fundo, não era nenhuma ameaça. O problema estaria no coronel, que mantém as terras e a miséria na região. No decorrer do filme, Antônio das Mortes adquire essa consciência e passa a lutar contra esse dragão da maldade.
Os anos que vão de 1968 a 1970 são, sem dúvida, os de maior produtividade do cineasta. Enquanto se preparava para filmar O Dragão da Maldade, problemas burocráticos imobilizaram toda a equipe e, nesse intervalo, Glauber realizou Câncer, sua experiência no campo da estética do Cinema Marginal. Mal termina aquele e viaja para a África, onde realizaria O Leão de Sete Cabeças, com produção francesa. Se seu cinema estava de alguma forma ligado ao Brasil e sua situação política, a partir de O Leão de Sete Cabeças sua preocupação com a situação do povo, do oprimido, do colonizado, se amplia, chegando à África, à América Latina e se estendendo a todo o mundo subdesenvolvido, o chamado Terceiro Mundo.
Desse seu novo horizonte nasce, em 1970, Cabeças Cortadas, produção espanhola filmada na Catalunha. Retrata o tirano Diaz II em seu final de vida, quando relembra suas crueldades e a situação do povo. O cinema de poesia está aqui em altas doses, não havendo uma história linear a ser seguida nem as formas clássicas de fundir som e imagem. Glauber expõe as ruínas das ditaduras, tanto latinas quanto ibéricas (lembremos que uma ditadura comandava o Brasil, e Portugal e Espanha viviam sob os regimes autoritários de Salazar e Franco), e subverte a relação do som com a imagem, assim como a montagem, para chegar à idéia de delírio e decadência que levaria à revolução. O teor revolucionário deixa de ser alegórico para ser explícito, com frases de impacto, tais como “não há fortuna sem sangue” e “não temas, se matar o rei, herdarás a coroa e serás rei”.
Em 1971, Glauber deixa o Brasil. Esse exílio “voluntário” marcaria-o por suas andanças por Europa, Cuba e Estados Unidos, países onde tentaria agilizar fundos para outros filmes. Na Itália, em 1975, Glauber voltaria a filmar – surge Claro. Após uma fracassada tentativa nos Estados Unidos de conseguir recursos para a produção de A Idade da Terra, cujo roteiro fora escrito em seus anos de exílio, e/ou de uma adaptação de The Wild Palms, de William Faulkner, Glauber retorna ao Brasil em junho de 1976. Sua volta seria conturbada, principalmente na relação com o ambiente cultural nacional, quase todo ele formado por indivíduos de esquerda, devido a uma carta escrita por Glauber e publicada por Zuenir Ventura em 1974 na revista Visão em que o diretor elogiava os militares e acreditava que Geisel levaria a uma democratização do país. As expressões “Golbery gênio da raça” e “militares legítimos representantes do povo” ecoaram como heresia e loucura.
Como escreveu o jornalista Geraldo Mayrink em “Citizen Glauber”, texto publicado na Playboy em 1981 e revisto para a coletânea Obrigado pela Lembrança (Unimarco Editora, 2001), “quando foi embora, era quase um santo da revolução, uma espécie de mártir. Quando voltou, era um apóstata que renegava suas origens revolucionariamente santas”. Tal postura, as declarações bombásticas contra antigos amigos e companheiros e o fato de escrever artigos para jornais governistas, como o Correio Braziliense, aumentaram ainda mais seu isolamento do cenário cultural e sua fama de que voltara louco do exílio. Sua situação só piorou com a morte da irmã Anecy, em março de 1977, que caíra num poço de elevador. O choque foi tamanho em Glauber que este, no romance Riverão Suassuna, escreve sobre investigações que fizera e de suspeitas que tinha de que a irmã fora assassinada pelo marido, o colega de cinema Walter Lima Júnior, assistente de Glauber em Deus e o Diabo. Mais: dizia que o próximo a ser morto seria ele.
Nesse ambiente de desgosto o cineasta ainda filmou o enterro do amigo artista Di Cavalcanti. Di Cavalcanti, ou Di-Glauber recebeu prêmio especial em Cannes e até hoje permanece inédito e censurado por ação da família Cavalcanti, que conseguiu na Justiça impedir sua exibição. A crítica é unânime em afirmar que este é seu último grande trabalho e que, de certa forma, resumiria todo o pensamento de Glauber a respeito do cinema.
Também em 1977 ele entrevista Jorge Amado diante das câmeras e monta Jorjamado no Cinema, média-metragem produzido pela Embrafilme idealizado para a divulgação televisiva. No início de 1978, depois de uma briga desgastante e polêmica com a Embrafilme, personificada na figura de seu presidente, o também cineasta Roberto Farias, Glauber começa as filmagens de A Idade da Terra, lançado apenas em 1980 e considerado seu pior filme. No Festival de Veneza, onde fora exibido, gerou enormes polêmicas e críticas negativas, o que resultou numa briga homérica de Glauber contra o diretor francês Louis Malle, a quem acusou de “fascista” e de cineasta de “segunda categoria” num barraco armado por ele num hotel da cidade.
A volta ao Brasil reacendeu em Glauber a chama do experimentalismo. A Idade da Terra é uma história que se passa em três cidades – Salvador, Rio de Janeiro e Brasília – em que não há uma narrativa compreensiva ou linear, apenas a anarquia barroca e histérica de imagens, sons e discursos, estes proferidos contra o Golpe Militar numa entrevista inserida dentro do filme. Além desse exercício metalingüístico, temos a cena em que ouvimos Glauber aos berros por detrás das câmeras gritar a Danuza Leão: “Danuza, mais alto, fala mais alto!!!”. Sobre o filme, Glauber afirmou: “É um novo cinema, anti-literário e metateatral, que será gozado e não visto e ouvido como o cinema que circula por aí. (...) É um filme que fala das tentativas do Terceiro Mundo, do mundo em que vivemos. Não dá para ser contado, só dá para ser visto” .
Após os conflitos em razão de A Idade da Terra, e por ter torrado uma grana alta da Embrafilme, acaba por ir a Paris e pretende mudar-se para Portugal. Era 1981 e em agosto acaba por ter problemas sérios de saúde. É internado e trazido para o Brasil em 21 de agosto, falecendo no dia seguinte aos 42 anos, conforme profetizara durante a vida toda a amigos. Seu enterro foi filmado por Silvio Tendler e, ironia das ironias, impedida de ser veiculada qualquer imagem por Lúcia Rocha, mãe do cineasta. Só recentemente que tais imagens foram liberadas e estão contidas no documentário Glauber, O Filme – Labirinto do Brasil, do próprio Silvio Tendler.
Morreu o cidadão Glauber Pedro de Andrade Rocha, sobreviveu o mito Glauber Rocha. Até hoje, algo a ser decifrado e reavaliado. Ou ignorado, combatido, depende de cada um de nós.
Fonte: por Lucas Rodrigues Pires em www.digestivocultural.com
Perdão, leitores, mas esse texto poderá estar como a maioria das pessoas imagina um filme de Glauber Rocha: longo, incompreensível e por demais chato. Mas não desistam, pois esse que é o maior nome do cinema brasileiro merece sua atenção.
Por que Glauber Rocha causa ojeriza ainda hoje? Por que a juventude e seu gosto pelo cinema de hoje fogem dele sem mesmo o conhecer? Por que combatê-lo, defenestrá-lo sem olhar atentamente à sua obra e buscar nela algo de útil e substancial para o cinema e para o Brasil?
Ofereço a vocês, caros, a chance de conhecer um pouco mais de Glauber Rocha e, assim, poder surrá-lo à exaustão. E não se importem se o texto está enaltecendo Glauber: órfãos de Glauber sempre vão existir, assim como saudosos da ditadura e eleitores do Maluf. Afinal, a democracia é feita da pluralidades de opiniões e pensamentos.
Genialidade e loucura, eis Glauber Rocha
Para Glauber, cinema era política. Sua obra pode ser dividida em três fases: num primeiro momento, a fase revolucionária, que abarcaria o início da carreira, quando filma o curta O Pátio ainda no Colégio Central de Salvador, até a conclusão de Terra em Transe, que seria a reavaliação de Glauber para as esquerdas no Brasil e sua relação com o Golpe Militar de 1964; uma segunda fase que se pode chamar de estrangeira, começando com o curta de estética marginal Câncer, passando por seu maior êxito comercial, O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro e desembocando nas produções estrangeiras realizadas no exílio no decorrer dos anos 70 – Cabeças Cortadas, O Leão de Sete Cabeças, História do Brasil e Claro; finalmente, a volta do exílio, a fase final de sua trajetória, mais voltada ao experimentalismo. Fazem parte desta o curta Di-Glauber, o média-metragem Jorjamado no Cinema e seu filme derradeiro, o mais radical de todos, A Idade da Terra.
Da crítica cinematográfica, iniciada em Salvador no final dos anos 50, passaria às filmagens em 1960, já enturmado com a turma do cinema, quando prepara a produção de Barravento, a ser dirigida pelo amigo Luiz Paulino dos Santos. Mas logo nos primeiros dias de filmagens o gênio forte de Glauber viria à tona e um desentendimento entre eles leva Glauber a destituir o amigo do cargo e, assim, assumir a direção deste que viria a ser seu primeiro longa-metragem, só exibido no Rio de Janeiro em 1964. Barravento já dava mostras do que viria a ser seu cinema, uma obra voltada ao oprimido e que pregava abertamente a revolução. O filme narra a história de um grupo de pescadores em Buraquinho, na Bahia, que é explorado pelo dono da rede de pesca, mas, mesmo assim, mantém-se passivos diante do fato. O conflito nascerá quando Firmino, recém-chegado da cidade e vendo a situação condenatória e alienante de sua gente, tenta, a todo custo, libertar a população de sua condição passional e incitar uma revolta. Ao final, percebemos que o povo não estava preparado para a revolução, mas havia traços de que poderia vir a estar.
Em 1963, já no Rio de Janeiro, publica seu primeiro livro, Revisão Crítica do Cinema Brasileiro, onde, como o próprio nome diz, faz uma abordagem crítica da história do cinema brasileiro, criticando filmes que foram grande sucesso, como O Cangaceiro, as chanchadas e o esquema de produção industrial da Vera Cruz. Ao mesmo tempo, evoca os ideais que regeriam o Cinema Novo, fazendo um histórico do movimento que revolucionaria o cenário cinematográfico nacional. Ainda, em Revisão Crítica, Glauber elege dois cineastas como modelo de verdadeiros autores do cinema: resgata Humberto Mauro, o grande nome do cinema brasileiro desde os fins dos anos 20, e aponta o cinema social recente de Nelson Pereira dos Santos como uma tendência a ser seguida. Elogia abertamente Rio 40 Graus e o coloca como a faísca para o surgimento dos cinemanovistas.
Com esse pensamento que Glauber filma Deus e o Diabo na Terra do Sol, considerada sua obra máxima ao lado de Terra em Transe. Na verdade, ambos os filmes formam uma única obra em seu todo – caminham da esperança revolucionária demonstrada ao final de Deus e o Diabo ao desencanto niilista com o que foi da revolução após o golpe militar em Terra em Transe (sobre isso, ver minha coluna anterior publicada neste mesmo Digestivo).
Deus e o Diabo trazia à tona a revolução, preparava o povo para a tomada de poder (o filme fora lançado dias antes do Golpe de 31 de março de 1964). Como vários outros exemplares do Cinema Novo, buscava tirar o povo de sua condição submissa e colocá-lo à frente da revolução. Frente à opressão e exploração, apenas uma reação violenta se espera daquele que sofre a ação injusta. O mesmo que fez Manuel vaqueiro ao ser passado para trás pelo fazendeiro. O mesmo que fez Antônio das Mortes, o matador de cangaceiros, ao acabar com o transe alienante – o cangaço e o misticismo – em que Manuel e Rosa se meteram em sua trajetória rumo à conscientização. Depois de tudo isso, o povo poderia correr livre em direção ao mar, quando o mar viraria sertão e o sertão viraria mar.
Quando se deu o Golpe Militar no Brasil, Glauber estava em Cannes para a exibição do filme no festival. Receoso em voltar, passa uma temporada na Europa, quando apresenta seu mais famoso texto, o manifesto Estética da Fome. O colonialismo dependente latino estaria gerando a fome, e esta moveria o Cinema Novo. Escreve Glauber: “nossa originalidade é a nossa fome e nossa maior miséria é que esta fome, sendo sentida, não é compreendida”. Seria essa fome que levaria a legitimar uma reação violenta: “... a mais nobre manifestação da fome é a violência. (...) somente conscientizando sua possibilidade única, a violência, o colonizador pode compreender, pelo horror, a força da cultura que ele explora. Enquanto não ergue as armas o colonizado é um escravo...”. Essa violência estaria no que seria retratado – a verdade da miséria –, mas também no formato, no como seria filmada determinada história.
No final de 1965, Glauber volta ao Brasil e é preso, juntamente com outros seis intelectuais, quando protestavam contra a ditadura durante uma reunião da Organização dos Estados Americanos (OEA). Ele fica detido por 23 dias. No começo de 1966, vai ao Norte do país e filma Maranhão 66, um curta documental sobre a posse do governador José Sarney em que o diretor faz uma montagem paralela entre as cenas da posse e a miséria do povo. Cenas desse documentário seriam usadas em Terra em Transe, que começaria a filmar no segundo semestre do mesmo ano.
Terra em Transe nasceu do questionamento a respeito da passividade da classe média e do povo diante do Golpe Militar e se transformaria no balanço da sua própria geração. Paulo Martins é o poeta e militante que trafega pelos dois lados da política. Ora o vemos ao lado do populista Vieira ora ao lado de Porfírio Diaz, o homem de direita com tendência ditatorial. O filme é narrado em flashback, pois logo no início temos a perseguição da polícia a Paulo Martins, quando este é ferido e agoniza relembrando sua história. O filme se passa em um país fictício – Eldorado –, mas facilmente identificado como o Brasil. Mesmo os personagens têm semelhanças não coincidentes com personagens reais da vida política do período do Golpe.
O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro, filmado em 1968 e lançado no ano seguinte, seria o primeiro filme em cores e a obra de maior sucesso comercial de sua carreira, além de lhe render a Palma de Ouro de melhor diretor em Cannes. O filme recupera o personagem Antônio das Mortes, criado por Glauber em Deus e o Diabo, numa saga de perseguição ao cangaceiro Coirana que, no fundo, não era nenhuma ameaça. O problema estaria no coronel, que mantém as terras e a miséria na região. No decorrer do filme, Antônio das Mortes adquire essa consciência e passa a lutar contra esse dragão da maldade.
Os anos que vão de 1968 a 1970 são, sem dúvida, os de maior produtividade do cineasta. Enquanto se preparava para filmar O Dragão da Maldade, problemas burocráticos imobilizaram toda a equipe e, nesse intervalo, Glauber realizou Câncer, sua experiência no campo da estética do Cinema Marginal. Mal termina aquele e viaja para a África, onde realizaria O Leão de Sete Cabeças, com produção francesa. Se seu cinema estava de alguma forma ligado ao Brasil e sua situação política, a partir de O Leão de Sete Cabeças sua preocupação com a situação do povo, do oprimido, do colonizado, se amplia, chegando à África, à América Latina e se estendendo a todo o mundo subdesenvolvido, o chamado Terceiro Mundo.
Desse seu novo horizonte nasce, em 1970, Cabeças Cortadas, produção espanhola filmada na Catalunha. Retrata o tirano Diaz II em seu final de vida, quando relembra suas crueldades e a situação do povo. O cinema de poesia está aqui em altas doses, não havendo uma história linear a ser seguida nem as formas clássicas de fundir som e imagem. Glauber expõe as ruínas das ditaduras, tanto latinas quanto ibéricas (lembremos que uma ditadura comandava o Brasil, e Portugal e Espanha viviam sob os regimes autoritários de Salazar e Franco), e subverte a relação do som com a imagem, assim como a montagem, para chegar à idéia de delírio e decadência que levaria à revolução. O teor revolucionário deixa de ser alegórico para ser explícito, com frases de impacto, tais como “não há fortuna sem sangue” e “não temas, se matar o rei, herdarás a coroa e serás rei”.
Em 1971, Glauber deixa o Brasil. Esse exílio “voluntário” marcaria-o por suas andanças por Europa, Cuba e Estados Unidos, países onde tentaria agilizar fundos para outros filmes. Na Itália, em 1975, Glauber voltaria a filmar – surge Claro. Após uma fracassada tentativa nos Estados Unidos de conseguir recursos para a produção de A Idade da Terra, cujo roteiro fora escrito em seus anos de exílio, e/ou de uma adaptação de The Wild Palms, de William Faulkner, Glauber retorna ao Brasil em junho de 1976. Sua volta seria conturbada, principalmente na relação com o ambiente cultural nacional, quase todo ele formado por indivíduos de esquerda, devido a uma carta escrita por Glauber e publicada por Zuenir Ventura em 1974 na revista Visão em que o diretor elogiava os militares e acreditava que Geisel levaria a uma democratização do país. As expressões “Golbery gênio da raça” e “militares legítimos representantes do povo” ecoaram como heresia e loucura.
Como escreveu o jornalista Geraldo Mayrink em “Citizen Glauber”, texto publicado na Playboy em 1981 e revisto para a coletânea Obrigado pela Lembrança (Unimarco Editora, 2001), “quando foi embora, era quase um santo da revolução, uma espécie de mártir. Quando voltou, era um apóstata que renegava suas origens revolucionariamente santas”. Tal postura, as declarações bombásticas contra antigos amigos e companheiros e o fato de escrever artigos para jornais governistas, como o Correio Braziliense, aumentaram ainda mais seu isolamento do cenário cultural e sua fama de que voltara louco do exílio. Sua situação só piorou com a morte da irmã Anecy, em março de 1977, que caíra num poço de elevador. O choque foi tamanho em Glauber que este, no romance Riverão Suassuna, escreve sobre investigações que fizera e de suspeitas que tinha de que a irmã fora assassinada pelo marido, o colega de cinema Walter Lima Júnior, assistente de Glauber em Deus e o Diabo. Mais: dizia que o próximo a ser morto seria ele.
Nesse ambiente de desgosto o cineasta ainda filmou o enterro do amigo artista Di Cavalcanti. Di Cavalcanti, ou Di-Glauber recebeu prêmio especial em Cannes e até hoje permanece inédito e censurado por ação da família Cavalcanti, que conseguiu na Justiça impedir sua exibição. A crítica é unânime em afirmar que este é seu último grande trabalho e que, de certa forma, resumiria todo o pensamento de Glauber a respeito do cinema.
Também em 1977 ele entrevista Jorge Amado diante das câmeras e monta Jorjamado no Cinema, média-metragem produzido pela Embrafilme idealizado para a divulgação televisiva. No início de 1978, depois de uma briga desgastante e polêmica com a Embrafilme, personificada na figura de seu presidente, o também cineasta Roberto Farias, Glauber começa as filmagens de A Idade da Terra, lançado apenas em 1980 e considerado seu pior filme. No Festival de Veneza, onde fora exibido, gerou enormes polêmicas e críticas negativas, o que resultou numa briga homérica de Glauber contra o diretor francês Louis Malle, a quem acusou de “fascista” e de cineasta de “segunda categoria” num barraco armado por ele num hotel da cidade.
A volta ao Brasil reacendeu em Glauber a chama do experimentalismo. A Idade da Terra é uma história que se passa em três cidades – Salvador, Rio de Janeiro e Brasília – em que não há uma narrativa compreensiva ou linear, apenas a anarquia barroca e histérica de imagens, sons e discursos, estes proferidos contra o Golpe Militar numa entrevista inserida dentro do filme. Além desse exercício metalingüístico, temos a cena em que ouvimos Glauber aos berros por detrás das câmeras gritar a Danuza Leão: “Danuza, mais alto, fala mais alto!!!”. Sobre o filme, Glauber afirmou: “É um novo cinema, anti-literário e metateatral, que será gozado e não visto e ouvido como o cinema que circula por aí. (...) É um filme que fala das tentativas do Terceiro Mundo, do mundo em que vivemos. Não dá para ser contado, só dá para ser visto” .
Após os conflitos em razão de A Idade da Terra, e por ter torrado uma grana alta da Embrafilme, acaba por ir a Paris e pretende mudar-se para Portugal. Era 1981 e em agosto acaba por ter problemas sérios de saúde. É internado e trazido para o Brasil em 21 de agosto, falecendo no dia seguinte aos 42 anos, conforme profetizara durante a vida toda a amigos. Seu enterro foi filmado por Silvio Tendler e, ironia das ironias, impedida de ser veiculada qualquer imagem por Lúcia Rocha, mãe do cineasta. Só recentemente que tais imagens foram liberadas e estão contidas no documentário Glauber, O Filme – Labirinto do Brasil, do próprio Silvio Tendler.
Morreu o cidadão Glauber Pedro de Andrade Rocha, sobreviveu o mito Glauber Rocha. Até hoje, algo a ser decifrado e reavaliado. Ou ignorado, combatido, depende de cada um de nós.
Fonte: por Lucas Rodrigues Pires em www.digestivocultural.com
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